sexta-feira, 11 de abril de 2008

Sereno


Dizes-me com uns olhos traçados de algo que quase se pode chamar serenidade.
- Não vale a pena, nunca vale a pena.
Olho-te com os olhos com traços nítidos de ódio.
- Vale sim!
- Não – Respondes com esses teus gestos serenos que me irritam quando estou nervosa. – Nunca vale a pena!
- Não me venhas com isso, não me venhas com soluções pensadas, não me venhas com soluções cheias de equilíbrio, cheias de calma e serenidade, cheias de sabedoria.
Ficas com aquele sorriso deliciado que sempre fazes perante a minha completa incapacidade de governar os meus sentimentos. Já sei que te diverte o meu desgoverno, mas agora não, agora peço-te que te descontroles comigo.
Levantas-te do sofá e sentas-te ao meu lado, olhando-me sem tremuras nem tremores, as tuas mãos tremem apenas ao ritmo alucinado das minhas.
- Não posso, não posso nem tão pouco quero racionalizar nada disto!
-Não racionalizes então, mas deixa que o tempo o faça por ti, talvez seja mais fácil assim.
- Não – Dizes de novo em tom sapiente, quase como sentença.
- Olha para mim - peço-te – Achas justo?
Os teus olhos traçam de cor diferente por um segundo, mas por um segundo apenas.
- Não, mas não resolve nada meu bem.
Envolves-me os ombros com o teu braço com cabos de aço e músculos de tesos mas que me assentam como seda leve. Encostas-me a cabeça no teu peito.
- Chora meu bem, chora...
- Nem sei se consigo, não, não consigo, não é chorar que eu quero!
- Mas é chorar que deves.
Irrita-me a tua calma, mas sem ela eu seria um canhão descontrolado. Calo-me, ouço o bater leve do teu coração dentro do meu ouvido.
Eu sei bem o quanto te dói, a ti também, no entanto tu nunca foste desgovernado de emoções.
Fazes-me festas doces no cabelo, com a tua enorme mão calma e pesarosa. Olhas-me e de repente, como se fosse um cisco invisível, lá está, lá está ele glorioso ardendo devagar mas consistente, aceso para sempre.

11 comentários:

Joaninha disse...

Dou uma prendinha a quem adivinhar o que era que ardia lá dentro!

Allanah disse...

Não faço a menor ideia! Mas é tão lindo o meu paizinho!

Abobrinha disse...

Joaninha

Tanto pode ser amor como ódio. São sentimentos assustadoramente próximos.

Joaninha disse...

Abobrinha,

Escolhe um delas porque andas lá muito perto!

Anónimo disse...

Tem que haver alguém a manter o controlo da situação. O elo mais forte da cadeia é que tem que ligar as pontas.

Bjins

antonio ganhão disse...

Uma escrita assim não deve ser racionalizada, não se deve prender a escolhas, ou a chama da vida apaga-se sentro de nós, logo depois de ter recebido a força de um abraço.

Abobrinha disse...

Joaninha

Prefiro que seja o amor e acredito que seja esse. Porque essa chama consegue levar bem mais longe que o ódio porque as motivações são melhores e não se perde de vista o que se pretende.

António Inglês disse...

Amiga Joaninha

Pois quem nos protege assim tem para além do amor, da sabedoria e da calma, muito calo no... dito cujo.
A vida é uma escola que nos vai dando essa sabedoria de refrear os sentimentos, as nossas reacções e as nossas emoções.
Eu já vi este filme noutro lado...
O que ardia lá dentro? Revolta....
Um abraço
António

Joaninha disse...

António,

Muita, muita revolta ;)

joshua disse...

Eu todo sou uma chama viva de emoções exacerbadas e de revoltas acesas. Posso compreender-te e compreendo inteiramente e isso é partilha.

PALAVROSSAVRVS REX

Anónimo disse...

Mt bonito .